A história da KISS é quase um manual do rock-business: espetáculo visual, decisões comerciais ousadas, conflitos internos e uma habilidade singular de transformar imagem em produto. Abaixo, um panorama cronológico da formação às decisões que culminaram na venda da marca, do catálogo e dos direitos de personalidade à Pophouse Entertainment, em um negócio estimado em US$ 350 milhões, que redefine o conceito de legado no rock.
Por Paulinho Cunha - Dreams FM
As origens (início dos anos 1970)
A KISS nasceu em 1973, em Nova Iorque, a partir da parceria entre Paul Stanley (vocal/rítmica) e Gene Simmons (baixo/vocal). A formação clássica também incluiu Ace Frehley (guitarra) e Peter Criss (bateria). Desde o começo, o diferencial era a teatralidade: figurinos, maquiagem exagerada e personagens distintos. The Demon (Simmons), Starchild (Stanley), Spaceman (Frehley) e Catman (Criss).
O impacto visual, aliado ao som potente, transformou a banda em algo além da música: uma marca.
Ascensão e o fenômeno comercial (décadas de 1970–1980)
O sucesso veio rapidamente. O álbum “Alive!” (1975) catapultou a banda e redefiniu o rock ao vivo. Turnês espetaculares e a exploração inteligente do merchandising consolidaram o nome “KISS” como sinônimo de espetáculo.
De bonecos a histórias em quadrinhos, tudo virava produto, e Gene Simmons, com sua visão empreendedora, transformou a banda em uma máquina comercial que transcendeu o palco.
Nos anos 1980, após trocas na formação e o abandono temporário da maquiagem, o grupo manteve relevância com novos hits e consolidou uma base de fãs que ultrapassou gerações. Mesmo quando a crítica duvidava, o público permanecia fiel o que reforçava a força da marca.
Reuniões, fama contínua e legado (anos 1990–2010)
Em 1996, a formação clássica se reuniu para uma turnê histórica. A nostalgia e a grandiosidade dos shows reavivaram o espírito original da banda.
Ao longo dos anos 2000, a KISS virou símbolo da cultura pop: presença constante em filmes, jogos, quadrinhos e, claro, nos palcos do mundo todo. O rock teatral da banda virou referência para gerações de artistas.
A despedida dos palcos: End of the Road (2019–2023)
Em 2019, a KISS anunciou sua turnê de despedida: “End of the Road”, encerrando cinco décadas de história com uma série de shows monumentais. A turnê, que atravessou o mundo, foi concluída em 2 de dezembro de 2023, no Madison Square Garden, em Nova York, onde tudo começou.
Naquele show final, a banda apresentou pela primeira vez os avatares digitais que representariam o futuro da KISS: uma banda que, literalmente, nunca morre.
A venda histórica e o que foi negociado
Em abril de 2024, a banda confirmou a venda de seu catálogo musical, nome, imagem, pinturas faciais, personagens e direitos de propriedade intelectual à empresa sueca Pophouse Entertainment Group, a mesma responsável pelo projeto ABBA Voyage.
O valor total da operação foi estimado em US$ 350 milhões, segundo Paul Stanley, vocalista e guitarrista da banda.
O pacote incluiu:
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Catálogo musical (masters e publishing);
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Marca e logotipo “KISS”;
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Personagens e likeness dos integrantes;
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Direitos de uso e exploração comercial global;
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Planos para shows com avatares, um filme biográfico e experiências imersivas.
As declarações oficiais e o que disseram Gene Simmons e Paul Stanley
Durante o anúncio oficial, Gene Simmons declarou entusiasmado:
“Sempre inovamos na cultura popular, e esta parceria garantirá que continuemos assim por muitos anos. Porque o que a Pophouse está fazendo é quebrar regras. Já temos vários planos em desenvolvimento, o show de avatares, um filme biográfico, uma experiência temática do KISS. O futuro não poderia ser mais empolgante!”
Em entrevista à People, Simmons reforçou que a decisão “felt like a natural thing to do”, explicando que a banda queria preservar o legado, não apenas lucrar.
Em outro trecho, ele comparou o ato de vender à relação de uma mãe com um filho:
"Nada está sendo passado adiante. Uma mãe pode dar à luz um filho, mas você nunca deixa de ser mãe, independentemente de o filho se casar ou não."
E completou:
"Não era uma questão de dinheiro. Era uma questão de respeito, respeito pela banda, pelos nossos fãs e pelo que o KISS significa."
Já Paul Stanley, sempre com um olhar artístico sobre o legado da banda, afirmou em comunicado:
"Nossa jornada com a Pophouse é alimentada pelo desejo de repercutir eternamente em diversas facetas da cultura global. Ao embarcarmos nessa empreitada, buscamos entrelaçar nosso legado na tapeçaria de diferentes mundos, garantindo que a experiência KISS continue a cativar tanto nossos fãs devotados quanto aqueles que ainda não descobriram a emoção."
E acrescentou em outra entrevista:
“The band deserves to live on because the band is bigger than we are. It’s exciting for us to go the next step and see KISS immortalized.”
"A banda merece continuar viva porque é maior do que nós. É emocionante para nós dar o próximo passo e ver o KISS imortalizado."
Essas declarações deixaram claro que o acordo foi muito mais que uma venda, foi uma parceria de imortalização. A Pophouse não comprou apenas músicas, mas sim um universo cultural.
O plano da Pophouse e o futuro digital da KISS
A Pophouse, fundada por investidores ligados ao ABBA, revelou planos ambiciosos:
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Um show permanente com avatares da banda;
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Um filme biográfico sobre a trajetória do grupo;
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Uma experiência temática interativa em formato de exposição, mesclando som, luz e realidade aumentada.
Com isso, o objetivo é perpetuar a experiência KISS para novas gerações, sem depender da presença física dos músicos.
“We are not saying goodbye,” reforçou Gene Simmons. “We are transforming into something that can last forever.”
Não estamos dizendo adeus”, reforçou Gene Simmons. “Estamos nos transformando em algo que pode durar para sempre.”
Um legado que nunca tira a maquiagem
A venda da KISS à Pophouse não encerra uma história — apenas muda seu formato.
Gene Simmons e Paul Stanley continuam como consultores criativos, garantindo que o espírito rebelde e teatral da banda permaneça intacto.
Com ou sem maquiagem, KISS sempre foi sinônimo de espetáculo, ousadia e visão empreendedora.
Hoje, mais de 50 anos depois, o quarteto mascarado que chocou o mundo no início dos anos 70 deixa os palcos físicos para habitar o futuro digital — e, como disse Paul Stanley,
“It’s not the end of KISS — it’s the beginning of its immortality.”
A trajetória da KISS é o retrato de uma era em que o rock deixou de ser apenas música e passou a ser uma marca global.
De Nova York ao mundo, da maquiagem à imortalidade digital, a banda transformou cada show, cada produto e cada nota em parte de uma experiência que ultrapassa o tempo.
Agora, com o apoio da Pophouse, KISS prova que o rock pode envelhecer, mas ídolos nunca morrem.